Caso AT&T e canais OTT entram no foco da Ancine
A AT&T ainda terá, ao que tudo indica, um caminho a percorrer até conseguir a certeza de que conseguiu toda a aprovação regulatória necessária para manter, no Brasil, o controle da WarnerMedia e da Sky e a linha de frente agora será a Ancine. A operação foi aprovada na semana passada pela Anatel.
Já se sabe desde o começo do processo de compra da Time Warner, em 2017 que a Ancine estava acompanhando o caso, tanto que opinou junto ao Cade e municiou a Anatel de informações sobre o mercado de programação. Mas vinha tocando a questão em fogo lento.
Em janeiro, contudo, conforme noticiado por aqui, a diretoria da Ancine remeteu o processo para uma nova análise concorrencial na superintendência de análise de mercado. A expectativa é que esta análise aconteça ainda no primeiro semestre, apurou este noticiário, e será um estudo de eficiência de mercado, para avaliar as consequências, impactos e custo-benefício do art. 5 da Lei n. 12.485, de 2011, no atual contexto da evolução disruptiva dos serviços de streaming. Atenta, a AT&T já pediu vistas do processo.
Mas a questão é: a Ancine tem poder para barrar a compra da WarnerMedia pela AT&T? A agência do audiovisual, ao contrário da Anatel, não outorga nenhum serviço, mas ao credenciar programadoras que podem atuar no mercado brasileiro, tem poder de regular quem participa do setor. A Ancine pode, por exemplo, retirar o credenciamento dos canais da WarnerMedia no Brasil (CNN, TNT, Cartoon, TBS, HBO, por exemplo) e com isso impedir que qualquer operadora brasileira, inclusive a Sky, distribua os canais. O que a Ancine não tem é poder de determinar a venda do controle da Sky, como poderia ter feito a Anatel.
Mas isso não quer dizer que a agência esteja com essa intenção. O pedido de análise concorrencial, por exemplo, se baseia em parecer da área jurídica da Ancine, em análise da Secretaria Executiva, na legislação setorial (Lei 12.485/2011) mas também em dois dispositivos legais que sinalizam uma posição mais flexível: a Lei da Liberdade Econômica (Lei 13.874/2019) e a Lei de Introdução às Normas do Direito (Decreto Lei 4.657/42, atualizado pela Lei 13.655/2018), especialmente no artigo 20 desta última. Trata-se de dispositivo que prevê que “nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão” e que “a motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas”.
Próximos passos
A partir desta análise econômica, a diretoria da Ancine avaliará a operação da AT&T à luz da Lei do SeAC, decidindo se o caso da compra da WarnerMedia se submete a vedação legal. No passado, a Ancine já havia manifestado o entendimento que sim, mas não em deliberação de todo o colegiado, e sim em pareceres técnicos e jurídicos.
Segundo apurou este noticiário, a Ancine também está se mobilizando internamente para contribuir mais ativamente com o debate legislativo em curso sobre a reforma na Lei do SeAC e estabelecimento de uma legislação para o VoD.
Além disso, a agência também quer apreciar a questão da oferta de canais lineares na internet naquilo que disser respeito ao mercado de produção e programação, regulados pela Ancine. Esta análise ainda não está acontecendo, mas segundo fontes da agência poderia acontecer de ofício ou por provocação de algum interessado.
A Anatel está em vias de deliberar sobre este assunto e, conforme mostrou este noticiário, a área técnica já concluiu em seu parecer que a oferta de canais lineares pela Internet é Serviço de Valor Adicionado, não sujeita portanto a regulação. Falta a análise da área jurídica e do conselho diretor da Anatel.
Evento
Nesta terça, dia 11 de fevereiro, o presidente da Ancine, Alex Braga, participa do Seminário Políticas de (Tele)Comunicações, organizado por este noticiário e pelo Centro de Políticas, Direito, Economia e Tecnologias de Comunicações da Universidade de Brasília (CCOM/UnB). A mesa de Braga é justamente sobre a revisão do modelo de TV por assinatura, com presença do conselheiro da Anatel, Moisés Moreira, e do senador Arolde de Oliveira, que relata no Senado o PL 3.832/2019, um dos principais projetos de mudança na legislação de TV paga. No mesmo evento, a diretora substituta Luana Rufino discute a regulação no C contexto da legislação de liberdade econômica. Mais informações sobre o evento, incluindo condições de credenciamento, participantes confirmados e outros temas, estão disponíveis no site www.politicasdetelecom.com.br
Samuel Possebon, Teletime, 10 de fevereiro de 2020