Mudar política de switch-off traz riscos, mas pode gerar economia para teles
A proposta dos radiodifusores de desatrelar o desligamento das transmissões analógicas da devolução do espectro de 700 MHz nas cidades em que isso é possível (cerca de 500 municípios) terá que ser analisada pelo governo (entenda-se novo ministro André Figueiredo) e pelo próprio Gired até o dia 14, que é quando haverá uma nova reunião em que isso pode ser colocado formalmente. Por enquanto, segundo fontes que acompanham de perto a negociação, a decisão é não fazer nada sem que haja um consentimento expresso e por escrito das empresas de telecomunicações, de modo a resguardar a segurança jurídica do processo.
Inicialmente, a reação das teles à possibilidade foi a pior possível, pois a análise foi de que o risco de a faixa de 700 MHz não ser liberada aumentou. Mas há alguns elementos que ainda precisam ser ponderados.
Com um desligamento focado apenas nas 500 cidades em que o espectro de fato é mais congestionado e é preciso digitalizar todas as emissoras para liberar o espectro de 700 MHz para a banda larga móvel, a EAD (empresa gerida pelas teles e que fará os investimentos na limpeza da faixa) poderia, em tese, até economizar dinheiro. Isso porque uma das despesas mais pesadas no processo de desligamento, que são as campanhas de esclarecimento e a estrutura de suporte e atendimento ao usuário não seriam necessárias nas outras 5 mil cidades brasileiras. Também seriam reduzidos os custos com equipes de instalação e mitigação de interferências.
Inicialmente, houve quem cogitasse uma economia também na compra dos equipamentos de decodificação para a população que receberá gratuitamente por fazer parte do Bolsa Família, já que nessas 5 mil cidades que não mais seriam digitalizadas está grande parte dos beneficiários. Mas a leitura é que o custo político de não ajudar a levar TV digital a essa população seria muito grande. Mas é uma decisão política que ainda precisa ser tomada. Se as caixas destinadas aos usuários do Bolsa Família puderem ser cortadas, haverá uma significativa economia no orçamento da EAD, de R$ 3,6 bilhões.
Outra dúvida é se nas cidades em que não houver o desligamento as teles seriam obrigadas a custear novos transmissores digitais ou bastaria o custo de recalibrar os transmissores para outras frequências. Os radiodifusores, obviamente, não querem perder a chance de contar com esses recursos de digitalização e desejam que os transmissores sejam trocados mesmo assim, pois avaliam que hoje a maior parte dos equipamentos trabalha com sinal analógico ou digital.
Por fim, manter os sinais analógicos operando na maior parte do país por tempo indefinido tem um outro significado, que é o de não induzir ativamente a evolução da tecnologia. Com isso, a migração nessas cidades aconteceria de maneira orgânica, podendo ocorrer em um intervalo muito maior, com a hipótese de que o sinal analógico nunca seja desligado, como inclusive já consideraram como cenário plausível especialistas no mercado de radiodifusão.
Canais públicos
Uma questão que precisará ser considerada é se mantidas as transmissões da TV analógica haverá espaço para acomodar os sinais dos canais públicos previstos no Decreto 5.820/2006, que criou a Política de TV digital. Estão previstos os canais da Cidadania, Cultura, Educação e um para o Executivo, todos em fase de formatação. Nas cidades em que o espectro é congestionado e em que certamente será necessário o desligamento analógico para a liberação da faixa de 700 MHz, esses canais públicos devem ser acomodados no VHF alto (canais 7 a 14). Mas nas outras cidades, a previsão é que eles fossem acomodados no UHF. Se a proposta dos radiodifusores for adiante e o UHF em 5 mil municípios continuar tomado por emissoras analógicas e digitais, será necessário avaliar a viabilidade de acomodar os canais públicos.
Samuel Possebon, Teletime, Sexta-feira, 02 de outubro de 2015