Operadoras de satélite não vêem impacto imediato da crise no mercado
Na visão dos executivos de algumas das principais operadoras brasileiras de satélite atuantes no Brasil, a recessão deste ano e a provável continuidade do ambiente econômico desfavorável em 2016 não afetam os planos de longo prazo das operadoras nem a revisão dos planos de investimentos, mas existe uma preocupação imediata com os custos em dólar e com os efeitos da retração sobre os clientes. “Essa é uma indústria que não trabalha em ciclos de curto prazo e as decisões são tomadas com um horizonte muito longo. Vemos uma demanda ainda forte sobretudo no mercado de vídeo e muita coisa ainda vai se definir”, disse Jurandir Pitsch, da SES, durante o Congresso Latino-Americano de Satélites, realizado nesta sexta, 16, no Rio de Janeiro. Para Lincoln Oliveira, da StarOne, outro componente que precisa ser considerado além da crise é a entrada de novos concorrentes, que chegam com estratégias de preços mais agressivas, mas segundo ele o fato de a StarOne estar vinculada a um grupo de grande porte que atua em várias áreas ajuda a dar solidez aos negócios. “Estamos sólidos por conta de nossos clientes e por termos uma grande tele por trás”, disse (a StarOne é o braço de operação de satélites da Embratel, que por sua vez é parte do grupo América Móvil).
Para Mauro Wajnberg, da Telesat, o país ainda é muito carente de infraestrutura e isso ajuda a dar estabilidade aos negócios no setor de satélites. “Nos últimos anos vivemos um ciclo muito acelerado de expansão, mas a infraestrutura ainda é insuficiente”, disse.
Algumas operadoras, contudo, ressaltam a importância de uma nova postura comercial e estratégica, atuando com novas propostas de negócio e novos serviços. Para Márcio Brasil, da Intelsat, o momento para a indústria é bom mesmo com a crise, mas ele ressalta que as novas tecnologias de satélites de alta capacidade (HTS) e com transmissão em spot beams mudaram também a forma de prover o serviço. “Com a mudança no volume de tráfego, temos que pensar em mais performance, mais flexibilidade e mais acessibilidade”, disse.
Rodrigo Campos, da Eutelsat, o grande passo que está sendo dado pelas empresas de satélite hoje é em direção a modelos mais flexíveis de oferta de serviço. Ele também destaca a oportunidade que a desaceleração econômica traz para que se busque um planejamento mais adequado das empresas.
Sérgio Chaves, da Hispamar, ressalta o fato de que as operadoras hoje têm uma atuação ampla na América Latina, e que os desempenhos dos mercados são diferentes e acabam se compensando. “Quando começamos, 90% das nossas receitas eram na Europa, e hoje 70% delas estão na América Latina”, disse, referindo-se aos números da Hispasat, controladora da Hispamar. Segundo ele, a crise tem um impacto retardado nas empresas de satélite por conta dos contratos de longo prazo.
Mas a visão otimista precisa enfrentar a realidade do dólar a R$ 4, o que impacta os investimentos, compra de equipamentos e resultados locais no reporte aos acionistas estrangeiros. “É sem dúvida um motivo de preocupação”, diz Lincoln Oliveira. Nem toda a variação é repassada para os clientes, pois os contratos estão em reais, explica Jurandis Pitsch, mas existe um efeito de longo prazo. “Há uma concorrência também intensa dos novos entrantes e ganhos com o barateamento das tecnologias, o que evita que os custos aumentem muito para os clientes”. Mas ele acredita que algumas operadoras podem rever os planos de longo prazo que estão sendo desenhados agora, e entre os clientes possíveis do setor de satélite, que as operadora de DTH possam ser especialmente afetadas no longo prazo.
Desaceleração bem-vinda
Se existe uma desaceleração que foi bem recebida pelo setor de satélites é no ritmo de licitações de posições orbitais brasileiras realizadas pela Anatel. Com três leilões realizados desde 2011, a Anatel conseguiu nesse período registrar ágios expressivos e faturar valores relevantes com as licitações, mas segundo o próprio conselheiro da Anatel, Rodrigo Zerbone, que participou do evento, a orientação da agência agora é no sentido de esperar um pouco antes de iniciar novos processos. Nos debates durante o Congresso Latinoamericano de Satélites, os operadores aplaudiram essa decisão.
Futuro
Sobre as perspectivas do futuro da indústria, sobretudo com a introdução de novas tecnologias como as constelações de satélites de órbita baixa (LEO) e os serviços de banda Ka, existe um misto de empolgação e ceticismo entre os operadores. Para a SES, o modelo de satélites de órbita média (MEO) e LEO é promissor, tanto que a empresa é uma das investidoras da O3b, que opera uma constelação de satélites MEO. Mas para Jurandir Pitsch, a própria experiência da O3b mostra que muitas vezes a tecnologia demora um pouco mais a chegar nos parâmetros necessários a um business plan sustentável do que incialmente projetado. “O O3b levou sete anos para entrar no ar. Acho que a OneWeb pode estar superestimando a capacidade de chegar ao mercado dentro do cronograma, e muita coisa pode acontecer até lá”, disse Pitsch. Para Lincoln Oliveira, o motivo de ceticismo em relação aos modelos de grandes frotas LEO e MEO é na questão dos lançadores. “Hoje a tecnologia para lançar dezenas e centenas de satélites desses projetos é a mesma que usamos para satélites geoestacionários. É importante que essa tecnologia evolua também, mas acho que esses projetos podem contribuir para a evolução da indústria de uma maneira geral”.
Sérgio Chaves ressalta a relevância dos satélites no desenvolvimento de políticas públicas. “Hoje vemos vários países da América Latina usando satélites para políticas públicas de TV e banda larga em regiões desassistidas. O papel social do satélite é muito importante”, disse.
Samuel Possebon, Convergecom, Sexta-feira, 16 de Outubro de 2015