Whatsapp aprisiona os consumidores de baixa renda
O Facebook e o Instagram também.
O filósofo grego Platão, em sua obra República, cria uma metáfora chamada Mito da Caverna – pessoas que sempre estiveram presas numa caverna acreditavam que a realidade era a própria imagem refletida nas paredes. O Mito da Caverna, dessa forma, explica a ignorância em que as pessoas vivem, aprisionadas por sentidos e preconceitos que impedem o conhecimento da verdade.
É isso o que ocorre hoje com uma parcela significativa da população que, sem acesso amplo à internet, consideram que estar no Whatsapp ou no Facebook significa estar conectada. Na verdade, o que acontece é a formação de bolhas de trocas de mensagens nas quais a alienação e as fake news fortalecem uma realidade distorcida.
E quem são os responsáveis por isso?
Em documento encaminhado ao Ministério da Justiça, a Coalizão Direitos na Rede lembra que o Plano Nacional de Banda Larga, de 2010, estabelecia que até o início de 2015, esgotada a franquia de dados antes do final do mês, os provedores poderiam reduzir a velocidade do provimento, mas não poderiam bloquear o acesso à internet.
“Ocorre que – diz o documento -, a partir do final de 2014 as operadoras passaram a anunciar que os planos até então em vigor sofreriam alteração de forma que, esgotada a franquia antes do final do mês contratual, o acesso à Internet seria bloqueado”. Com isso, passaram a obrigar o consumidor a comprar mais créditos sob pena de terem o acesso bloqueado. As únicas portas garantidas de acesso passaram a ser via Facebook e Whatsapp, prática denominada de zero – rating (taxa zero). Que de zero ou gratuita não tem nada.
A partir da vigência do Marco Civil da Internet, contudo, os planos com a previsão de corte do fornecimento associados ao zero rating, e com o tratamento discriminado do tráfego de determinadas aplicações (Facebook, Instagram, Whatsapp, TikTok entre outros), passaram a ser ilegais.
Com base no Marco Civil da Internet estabeleceu-se que “o acesso à internet é o canal exclusivo para a fruição de outros serviços públicos, como é o caso da obtenção de certidões forenses, registro de boletim de ocorrência, declaração de imposto de renda, participação em consultas públicas instauradas pelos poderes públicos, dentre muitos outros, bem como para o exercício de direitos fundamentais como a liberdade de expressão e o direito à informação”. Apesar disso, milhões de cidadãos ficam aprisionados nos aplicativos citados acima.
Para 55% dos internautas, conforme pesquisa da Quartz, internet é sinônimo de Facebook. E esses “jardins murados” não significam somente limitações de acesso a Internet, mas de fruição de diversos direitos.
E prossegue o documento: “À primeira vista, o tráfego gratuito até poderia parecer benéfico para os usuários. Entretanto, tal visão é limitada. Isto porque o que se diz ser ‘gratuito’, em realidade se trata de enviesamento e, inclusive, obrigatoriedade de tráfego para aplicativos em específico. Trata-se, portanto, de caso clássico de venda casada, nos termos do art. 39, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor”.
Diante de tantas irregularidades a Coalizão Direitos na Rede propõe, entre outras sugestões, que a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) cobre das prestadoras de serviços de telecomunicações:
“a. Disponibilização de todos contratos firmados, em vigor ou expirados, com provedores de aplicações de internet contendo as regras para o patrocínio do tráfego dos pacotes de dados associados às aplicações (Facebook, WhatsApp, Instagram e TikTok – ByteDance)
b. A quantidade de dados consumidos pelos usuários nas aplicações associadas às práticas de zero-rating (ditas “gratuitas”, presentes nos planos pré-pagos)
c. A quantidade de dados consumidos por publicidade nos planos pré-pagos com franquia associada a zero-rating para as aplicações cujos pacotes são ofertados
d. Os requisitos técnicos indispensáveis que justificam a discriminação ou degradação de pacotes após o término da franquia, incluindo a proporcionalidade das medidas excepcionais adotadas conforme estabelecido no art. 5º do Decreto nº 8.771, de 11 de maio de 2016.”
O Instituto Telecom também aguarda por esses esclarecimentos.
Instituto Telecom, Terça-feira, 18 de abril de 2023