Remessa de teles brasileiras às sedes sobe até 150%

mar 10, 2014 by

Não há usuário que não deseje mais investimentos em serviços de telecomunicações no Brasil, onde imperam a baixa qualidade e os preços altos. A julgar pelos lucros crescentes das companhias do setor, sobram recursos para realizar melhorias na infraestrutura. Parte do dinheiro, porém, segue direto para o exterior e engorda o caixa das matrizes dos grandes grupos globais. Segundo especialistas e empresas de classificação de risco, as subsidiárias brasileiras de telefonia vêm aumentando o envio de seus lucros para fora do país, impedindo um avanço maior nos investimentos aqui. Em alguns casos, a alta na remessa de dividendos atingiu 150% entre 2009 e 2013. E há empresas que “exportaram” até 95% de seus ganhos anuais.

 

 

TIM e Vivo enviaram para suas matrizes cerca de R$15 bilhões em dividendos desde 2009. A Oi, dizem analistas, remeteu R$ 1,2 bilhão para a Portugal Telecom (PT) no período. A GVT, da francesa Vivendi, não divulga o quanto envia, assim como as empresas do grupo mexicano América Móvil no Brasil: Embratel, Claro e Net.

Segundo consultores, o aumento no envio de dividendos das teles brasileiras ocorre porque suas sedes – a maior parte na Europa — não querem abrir mão desses recursos, uma forma de reduzir seu endividamento e de compensar a queda na receita, afetada com a crise econômica.

-Todas as empresas no Brasil têm enviado às sedes mais recursos, que poderiam ser direcionados para elevar investimentos em infraestrutura, já que a qualidade dos serviços é ruim. As teles distribuem dividendos em um patamar bem maior que o mínimo de 25% do lucro – atesta o consultor Virgílio Freire, lembrando que a Vivo envia quase a totalidade do lucro.

Do outro lado do Atlântico, as matrizes querem os recursos das subsidiárias para não terem as notas de risco rebaixadas.

-Ao analisar o rating de uma empresa, levamos em conta o quanto vão receber de dividendos das subsidiárias, pois esses recursos entram no caixa. Essas empresas tentam não abrir mão disso, extraindo o máximo possível das filiais, que poderiam usar esses recursos em mais investimentos (no Brasil) — diz Soummo Mukherjee, analista sênior da Moody’s.

Eduardo Tude, presidente da consultoria Teleco, lembra que as empresas no Brasil estão em movimento de valorização, ao contrário de suas sedes na Europa:

-Aqui há um potencial de crescimento. Lá, a crise tem reduzido as receitas das teles. Por isso, elas precisam dos dividendos brasileiros. Esse dinheiro aqui poderia ser direcionado para mais investimentos.

Tude lembra, porém, que os investimentos aqui já são altos, pois a rede está em construção. Em 2013, até setembro, as teles destinaram R$ 17,6 bi — alta de 7% ante 2012. Mesmo assim, o número de reclamações só aumenta. Na Anatel, agência que regula o setor, as queixas cresceram 42%: de 8.452 em 2012 para 12 mil em 2013. A implementação da tecnologia 3G encontra desafios para avançar no país, onde 33,6% das cidades têm apenas uma operadora prestando serviços.

– O desafio é aumentar a capacidade da rede de dados. Além disso, o setor sofre com a alta carga tributária. A alíquota de ICMS varia de 25% a 35% — lembra Tude, destacando que o usuário brasileiro paga uma das contas mais altas do mundo.

Na Europa, desafios para elevar o caixa

Na TIM, 67% dos dividendos vão para o caixa da Telecom Italia. O envio subiu cerca de 150% de 2009 a 2013, de R$ 327,4 milhões para R$ 843 milhões. A empresa distribuiu 56% de seu lucro líquido aos acionistas no ano passado, patamar bem maior que os 35% de 2010. A empresa não quis comentar o teor da reportagem.

A Telefônica (dona da Vivo) destina 73,8% de seus dividendos para a Espanha. Assim, dos R$ 18 bilhões pagos entre 2009 e 2013, R$ 13 bilhões foram enviados à sede. A companhia afirma, no entanto, que no mesmo período os investimentos no país somaram R$ 27,4 bilhões.

– O Brasil é uma subsidiária importante para a Telefónica e tem rating melhor que o da sede. Se a matriz for rebaixada, a operação brasileira acompanhará a redução — diz Luísa Vilhena, diretora da S&P.

A PT, cuja geração de caixa é declinante, tende a se beneficiar da fusão com a Oi, prevista para ser concluída em junho.

– Com a fusão, o rating da PT pode subir e ficar igual ao da Oi. Se não ocorrer, a nota da PT pode cair – ressalta Luísa.

Entre 2011 e 2013, o grupo português reduziu o pagamento de dividendos em quase 60% à Telemar Participações (holding que controla a Oi e 10% da PT), de R$ 187,8 milhões para R$ 75,9 milhões. Já os dividendos da Oi à PT aumentaram mais de quatro vezes, diz uma fonte. Procurada, a Oi não comentou, pois está em “período de silêncio” devido à fusão com a PT.

A GVT, do grupo Vivendi, não quis se pronunciar, bem como Net, Claro e Embratel, do grupo América Móvil.

Ao contrário do Brasil, na Europa há redução dos dividendos aos acionistas locais. A Telecom Italia reduziu de € 900 milhões para € 450 milhões a distribuição de lucros entre 2013 e 2015. A Vivendi cortou dividendos em 28,5% nos últimos dois anos. Mesmo caminho fez a Telefónica, com corte de 34% entre 2012 e 2013.

 

– As empresas na Europa sofreram um período longo de desaceleração e retração. Há muitos desafios para elevar o caixa – diz Mukherjee, da Moody’s.

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