Governança da Internet: EUA se opõem ao modelo multilateral e conflitam com o Brasil
O debate sobre a governança da Internet ganha novos capítulos após a realização do Net Mundial, nos dias 23 e 24 de abril, em São Paulo. E fica evidente que há muito ainda para se discutir. A geopolítica terá papel crucial no futuro da Rede Mundial.
Em entrevista exclusiva por e-mail ao portal Convergência Digital, o assistente especial do presidente Barack Obama e coordenador de segurança cibernética, Michael Daniel, afirmou que os Estados Unidos acreditam que o IGF pode e deve fornecer uma plataforma valiosa para facilitar a importante e permanente discussão multissetorial. “Continuamos profundamente comprometidos com o IGF como o local de destaque para a comunidade global se reunir e discutir a governança e as políticas da Internet.”
Até o momento, o controle da ICANN é exercido pela NTIA, agência dos EUA responsável por aconselhar o presidente nos assuntos envolvendo políticas de telecomunicações e de informação. O atual contrato do governo dos Estados Unidos com a ICANN para gerenciar as funções técnicas de DNS expira em 30 de setembro de 2015, podendo ser estendido por até quatro anos, se a comunidade precisar de mais tempo para desenvolver a proposta de transição.
No entanto, para fazer a transição, os EUA impuseram algumas condicionantes. Além de contar com amplo apoio da comunidade, a proposta de transição deve seguir quatro princípios: apoiar e reforçar o modelo multissetorial (multistakeholder); manter a segurança, estabilidade e resiliência do DNS (siga em inglês para sistema de nomes de domínio); atender às necessidades e às expectativas dos clientes e parceiros globais dos serviços de internet; e manter a abertura da internet. Os EUA também deixaram claro que não vão aceitar uma proposta de transição que substitua o papel NTIA com uma solução conduzida por algum governo ou uma solução intergovernamental.
Em outras palavras, isto quer dizer que os Estados Unidos não aceitam um controle multilateral, posição diferente da defendida pela presidenta Dilma Rousseff, em sua participação na NetMundial — ela clamou por uma internet multissetorial e multilateral. Para o embaixador dos EUA e responsável pela área de TIC no governo de Barack Obama, Daniel Sepulveda, um modelo multissetorial endereçaria melhor os desafios da governança da internet se comparado com um modelo multilateral. Em entrevista para o Convergência Digital, Sepulveda ressaltou que o modelo multilateral é excludente de uma forma que o processo multissetorial não é.
“A razão é que um processo multilateral privaria os atores não-governamentais que hoje participam da governança da internet”, explicou. “O modelo multissetorial também leva a consideração de mais informações, a melhores decisões e a uma maior legitimidade. Também é mais capaz de lidar com a diversidade de problemas que surgem no campo da governança da internet e que exigem conhecimentos de diferentes áreas, como direito, política, tecnologia, indústria e sociedade.”
A posição norte-americana é a prova que há muito debate pela frente sobre o melhor modelo de governança da Internet. Ao final do Net Mundial, em abril, o documento do evento, batizado como Declaração Multissetorial de São Paulo, apontou para uma governança multissetorial e com o Fórum de Governança da Internet (IGF, na sigla em inglês para Internet Governance Forum) como instância indicada para ser “a plataforma para a discussão tanto de temas de longo prazo como emergentes, com vistas a contribuir para identificar os possíveis caminhos de como endereçá-los”.