Presidente da Parks prevê período de crescimento para industria de telecom

mar 23, 2010 by

Edgar Bortolini, presidente da Parks, indústria gaúcha de equipamentos de telefonia fixa, prevê um período de crescimento para o setor nos próximos anos. Ele acredita que os leilões de espectro (banda H e 3,5 GHz) pela Anatel, previstos para acontecer ainda este ano, e o lançamento do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) pelo governo são fortes indícios para alimentar seu otimismo. Somado a isso, cita as estimativas de crescimento para o país na casa de 5% a 7% em 2010.

“A privatização das telecomunicações em 1998 foi uma grande oportunidade, mas que não se realizou para a indústria nacional, porque ficamos de fora. Esperamos que essa situação mude agora”, disse Bertolini, em entrevista exclusiva ao Tele.Síntese. Mas para isso, defende a adoção de uma nova política industrial para o setor, que valorize a produção nacional.

Fundada em 1966, a Parks é a primeira empresa brasileira a obter a certificação para produção e comercialização de equipamentos para WiMAX. A empresa investiu em 2008 US$ 2,5 milhões na expansão de sua planta industrial com a aquisição de novos equipamentos e na produção livre de chumbo. Atualmente, a Parks está desenvolvendo produtos para difundir redes internas (Ethernet).

Tele.Síntese – A Parks já está produzindo equipamentos para WiMAX, mas o leilão da faixa de 3,5 GHz ainda não saiu.
Edgar Bortolini – A Parks é uma empresa 100% nacional e está preparada para produzir, mas precisa ter alguma proteção pelo menos do poder de compra do governo.

Em 2007, o presidente fundador da Parks, Paulo Renato, ainda estava vivo e decidiu apostar em wireless, porque até então era uma indústria voltada para equipamentos de par de cobre. Fez algumas incursões em fibra óptica, mas é uma empresa de cobre. E ai surgiu a questão do WiMAX, em 2007. Então a Parks tomou a dianteira e investiu em WiMax. Não tomou dinheiro do mercado, não procurou órgãos de fomento, não submeteu nenhum projeto. Começou usar recursos dela e foram milhões, na esperança de que saísse o mercado via leilão, que acabou cancelado.

Isso trouxe uma grande frustração, porque a Parks deixou de investir em outras áreas, pegou aquele cavalo que vinha passando, chamado WiMAX e que o mundo todo vinha falando e botou toda sua energia ali. Então isso foi uma frustração. Mas por outro lado, permitiu a Parks entrar em outros mercados, o de cidades digitais, mercados que o leilão não abrigava.

E permitiu que aprendessemos também sobre o mercado. Foi criada uma equipe comercial e começamos a disputar outros mercados de wireless.

O fato é que agora, olhando para trás, nós temos uma estrada em que colocamos sistemas em campo, vendemos. Ou seja, nós temos não só o paperware, mas também materializamos as idéias, nós temos efetivamente equipamentos em cidades digitais. Não saiu o leilão, mas nós aprendemos bastante e avançamos.

Então agora, num cenário de 2010 saindo o leilão, porque esse é um mercado diluído, vai ter várias empresas atuando nessa tecnologia e nós vamos participar desse esforço. A privatização das telecomunicações em 1998 foi uma grande oportunidade, mas que não se realizou para a indústria nacional, porque ficamos de fora. Esperamos que essa situação mude agora.

Tele.Síntese – Há possibilidade de venda para outros países?
Bortolini – É muito difícil porque todos os países protegem suas indústrias de telecom. Nós não conseguimos ir para Israel e vender na operadora de lá, por exemplo. Mas não é só lá. Nós não conseguimos ir para os EUA e vender na Verizon ou na Bellsouth. Eu não consigo vender na France Telecom nem na Deutsche Telecom. Na Deutsche Telecom estava a Siemens lá, mas só a Siemens. A Siemens tossiu, eles chamaram uma empresa israelense e deram uma fatia pequena, só para servir de ameaça. Os espanhóis, os portugueses, os dinamarqueses, canadenses, coreanos, chineses também fazem isso. E nós pegamos o nosso mercado e abrimos para todo o mundo.

Tele.Síntese – Esse é o principal problema da indústria nacional?
Bortolini – É. Nós ficamos traumatizados com a reserva de mercado. Nós éramos criticados por todo o mundo e resolvemos radicalizar. Aí saímos do oitenta para o oito, nós não fomos para o quarenta ou cinqüenta, nós abrimos todo o mercado. Nesse processo, foram dizimadas dezenas de empresas brasileiras.

Então, falando em modelos de desenvolvimento de ciência e tecnologia que todos esses países adotam que é o da hélice tripla, as coisas têm que andar de mãos dadas, o governo, a indústria e a universidade. O governo fica com o aspecto regulatório, políticas e mercado; a indústria com o fornecimento; e a academia com o pessoal de ponta.

As universidades daqui estão preparadas. Participaram da TV digital e tem toda a competência. A indústria que sobrou, não tem apoio. O governo nunca deu tanto dinheiro para pesquisa como agora e as universidades já estão recusando projetos Finep, porque falta uma coisa que os outros governos fazem, que é a proteção do mercado.

Por exemplo, se o governo decidisse adotar um sistema de carteira de identidade digital. Isso é segurança nacional e tem que ser feito por brasileiros, é simples. O Ministério da Defesa já faz isso. Tudo que ele manda desenvolver são coisas de segurança nacional e ai ele compra de empresas brasileiras. Outra coisa, a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) criou a rede Petros, para a Petrobras, que vai ser ampliada agora para o Pré-sal. A rede Petros funciona que é uma beleza. Se o cara quer comprar o parafuso ele cota lá fora e manda para a empresa nacional com as especificações e preço e pergunta se alguma pode fornecer o produto nas mesmas condições. E tem conseguido. É sensacional, empresas daqui do Rio Grande do Sul, que são fornecedoras, estão crescendo bastante por causa da Petrobras.

A Petrobras investe bastante em pesquisa e desenvolvimento, em plataformas e exploração de petróleo em águas profundas, e reserva o mercado dela para as empresas nacionais. Tem outro fato, a Petrobras tem operações sensíveis. Então quando ela compra um software de plataforma, por exemplo, ela compra um software aberto.

Se você lança uma rede como a do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), como promete o governo, de Norte a Sul, não terá só assinantes das camadas C, D e E, mas também haverá órgãos de governo ligados nela. E é preciso segurança.

O que aconteceu recentemente, um fornecedor internacional mandou um aviso de fim de vida de um equipamento (end of life). Ele diz, olha, aquele superroteador de US$ 200 mil, daqui a quatro meses vou obsoletá-lo. Então o fornecedor estrangeiro entra e sai do mercado quando ele quer. Nessas grandes redes, os países preferem produtos nacionais que eles tenham o domínio, porque tem coisas sensíveis. Por meio de um ataque de hacker, por exemplo, é possível tirar um roteador do ar, uma rede inteira do ar.

Eu me lembro da Telebrás lá no início, nos velhos tempos. A Parks desenvolveu o primeiro modem nacional. A Embratel comprou uma rede da Cesar francesa (que se tornou a Alcatel depois), mas exigiu os códigos fontes abertos. Todo o software aberto porque ela queria ter o domínio. Era a Renpac – Rede Nacional de Pacotes – que deveria ter 500 mil clientes ligados, inclusive bancos. Se depois a empresa estrangeira desaparecesse ou não desse suporte, ela tinha como seguir.

Então, nos outros países nós vemos esse cuidado. E não é só na área militar, mas na civil também. Na questão de dados sensíveis, dados da população brasileira, prontuários médicos, INSS, Banco do Brasil, Caixa. As vias onde circulam essas informações têm que ser vias privilegiadas, o domínio não pode estar fora. Os outros países pensam assim, falta o Brasil pensar assim também.

Tele.Sintese – O que o governo precisa fazer?
Bortolini – Falta reformular a Lei de Informática, rever a Lei do Bem, assim como a Lei de Inovação. É preciso modernizar esses três marcos regulatórios e o governo lançar uma política industrial nova para o setor de TICs. A Lei de Informática e os outros mecanismos foram bons na sua época, mas agora são obsoletos. Já não dão mais vantagens competitivas. E usar o poder de compra para proteger a indústria nacional. Mas para isso é preciso mudar a lei das licitações 8.666.

Tele.Síntese – E o Plano Nacional de Banda Larga pode ajudar a Parks e as empresas nacionais como um todo?
Bortolini – O PNBL surgiu assim para nós. Nós visitávamos o secretário de Logística e Tecnologia da Informação, Rogério Santanna, no Ministério do Planejamento,  em 2009, e ele só nos falava do backbone óptico, a grande espinha dorsal. Na espinha dorsal nós não temos oferta porque ela é óptica. Ai é para grandes players, empresas internacionais, a Padtec e a DataCom têm competências para isso. E ai nós chegamos até a dizer a ele que, se precisasse capilarizar o backbone, precisasse sair dessa grande estrada e chegar mais próximo do assinante final, podia contar com a Parks. Essa foi sempre a mensagem que deixamos lá.

A coisa mudou realmente no início de dezembro, quando houve uma reunião com os ministros e o presidente Lula. O ministro Hélio Costa colocou ali sua posição e naquele momento coincidiu, próximo do Natal, o Minicom liberou aquele plano “O Brasil em Alta Velocidade”, com um plano detalhado de banda larga. E o Ministério do Planejamento apresentou o plano de ativação do backbone usando as fibras ópticas da Eletronet, e a sugestão de reativar a Telebrás. E ai alguém disse, não sei se o Lula, ‘nós queremos uma solução completa, para chegar a onde a tele não vai, não quer ir, não é interessante, não dá retorno sobre investimento. Então voltem aqui e me apresente um plano de A a Z’. Nós viemos monitorando essa reunião. Ela teria que acontecer na última semana do ano ai os técnicos jogaram a toalha e disseram que não conseguiriam terminar a tempo porque era muito complexo. E a reunião caiu para fevereiro.

Tele.Síntese – A inclusão do acesso no plano despertou o interesse da indústria nacional?
Bortolini – Quando em dezembro sinalizaram que a questão era de ‘A a Z’, que era bem maior, isso fez acender uma luz vermelha aqui. Vimos que havia oportunidade no nosso radar. Nós somos uma empresa que poderíamos capilarizar banda e chegar aonde tivesse que chegar, seja num órgão público, numa escola, até numa favela, numa moradia, fazendo a última milha.

Então para nós esse plano virou uma oportunidade grande. Esse número que eles falam de atender em 2010 de 200 a 300 municípios, serviu de base para que traçassemos um plano para atender na última milha. É tecnologia nacional, preço bom, um sistema competitivo, desenhado aqui, enfim, pode incluir o Ceitec num segundo estágio, fazendo chips dedicados. Por exemplo, o Ceitec tem uma competência nas etiquetas eletrônicas que podem ser usadas (código de barra eletrônico), então essas competências podem ser somadas. Mas ai também as ações da Telebrás estavam estourando, tinha um entusiasmo grande.

Tele.Síntese – E o que vocês fizeram com a proposta?
Bortolini – Nós entregamos no Ministério das Comunicações. Mas o fato é que a reunião do dia 10 de fevereiro se prolongou por muitas horas, porém, não houve decisão. Então a partir dali nós começamos a trabalhar com outros cenários. E o fato do José Dirceu ainda nem tinha ocorrido. Depois da divulgação da pretensa utilização de tráfego de influência do ex-ministro, nós colocamos as barbas de molho. Porque aquele cenário passou a ser muito otimista.

Tele.Síntese – Vocês trabalham com qual cenário, atualmente?
Bortolini – O cenário que o mercado está trabalhando é 2011, em 2010 não acontece nada. Pode ser que uma parte seja contratada em 2010, mas a implantação em campo ficará para 2011. Esse é o cenário real, provável. Tem que se levar em conta que agora tem uma janela apertada, por causa das eleições, com vários ministros deixando o cargo para a disputa eleitoral, e muita coisa pode mudar.

A decisão final ficou para depois do carnaval, depois adiada para março e agora empurrada para abril. Isso nos deixou pouco cético de que ocorra já. Agora, não existe outro projeto igual no mundo, nós já rastreamos o mundo inteiro a não ser o da Austrália, e isso faz com que o mundo inteiro olhe para nós. Porque no mercado de telecom, que é um mercado que está cada vez mais difícil, você não encontra outra oportunidade como essa abaixo da linha do equador nesse momento.

Tele.Síntese – E o 2,5 GHz, a Parks tem algum equipamento para essa faixa, que possa ser usado pelas empresas de MMDS?
Bortolini – Nós continuamos acreditando no 2,5 GHz. As operadoras de MMDS também querem fornecer o serviço de dados, usar essa banda para serviços de acesso à internet. E nós estamos investindo nisso sim, continuamos acreditando que isso ainda venha a ocorrer. Nós temos alguns ensaios realizados. Mas os detentores dessas frequências estão aguardando a posição da Anatel.

Tele.Síntese – Mesmo que aumente um pouco, além dos 40 MHz proposto, ainda será pouco para oferecer banda larga e TV por assinatura…
Borotlini – Se ficar uma banda muito pequena, restringe e até pode acabar com o serviço. Mas também, se oferecer apenas banda larga, as empresas perdem a capacidade competitiva. Sem oferta conjunta, a oferta fica enfraquecida. Nossa expectativa é que tenha a liberação da banda que permita que os provedores de MMDS ofertem serviços de dados e TV. E a Parks estaria também preparada para ofertar equipamentos nessa faixa de freqüência. Nós estamos investimos nessa linha sim. O tanto de investimento que faremos nisso será definido a partir dessas deliberações da Anatel.

Tele.Síntese – Parece que o mundo inteiro está destinando essa faixa para o LTE…
Bortolini – É, mas é uma coisa para longo prazo. É uma reserva de freqüência para soluções que são ainda absolutamente proprietárias. Então, para se ter um serviço de LTE tem um caminho muito longo a percorrer. É preciso muito investimento. A rede de 3G ainda não se rentabilizou como vai ser implantada nova rede, já que elas não são compatíveis? Eu acho que um país continental como o nosso, com uma carência de inclusão digital imensa, é preciso oferecer acesso. Se existe hoje meios de viabilizarmos isso em cima do WiMAX, que existe uma indústria nacional capaz de prover isso, por que não fazer?
 

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