Adiar a LGPD é permitir que Governo Bolsonaro trave a Lei até 2022
Se não existisse a Medida Provisória 959, a Lei Geral de Proteção de Dados (13.709/18) entraria em vigor nesta sexta, 14/8. Mas até que a MP seja votada ou perca validade, o que acontece em duas semanas, a LGPD só entrará em vigor em maio de 2021. Se caducar, a Lei passa a valer imediatamente.
Assim defende que aconteça o deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), relator da LGPD na Câmara. Neste segundo aniversário da sanção da Lei, ao participar de um debate online promovido pela Data Privacy Brasil, Silva reforçou o perigo de novos adiamentos caso o Congresso chancele mais esse.
“Se houver sucesso e a Medida Provisória 959 for aprovada nos termos que o governo propôs, adiando para maio do ano que vem, em janeiro o governo vai começar um movimento para uma nova MP par adiar a vigência para 2022. Está claro que há uma decisão política de obstruir a implementação da lei”, afirmou.
Silva contou ter participado neste mesmo aniversário de uma reunião virtual com empresas que pedem o adiamento. “Acabei de sair de uma reunião com 60 associações empresariais, em que elas reivindicam a votação da MP 959. Disse a eles que o argumento de que não pode haver vigência porque não tem regulamentação é um argumento cretino, com o perdão da palavra. Até fevereiro ainda não se falava de pandemia e o Decreto não veio. Tenho todos os motivos para estar convencido de que há uma tentativa de obstruir a implementação da lei, para que a coleta e tratamento de dados se dê nos termos de hoje, inclusive para manejo político.”
O deputado deixou a ‘live’ por ter sido chamado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia. “Estou com a intuição que ele quer falar da MP 959”, explicou. Silva acredita que pode ser construído um acordo que contemple o adiamento da LGPD, mas com garantias de aprovação da PEC 17, que inclui a proteção de dados na Constituição e federaliza o tema, e de criação da ANPD.
“Sinalizei que podemos adiar a vigência, mas então vamos votar a PEC 17 e regulamentar a Lei. Estou convencido que a eficácia da Lei está vinculada à existência da ANPD. Não tenho dúvida. É necessário ter uma autoridade para editar normas infra legais para permitir que a Lei seja como foi concebida. Nós pactuamos isso.”
Antes de deixar o debate, o deputado revelou que a demora na implantação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados pode ser questionada em breve no Supremo Tribunal Federal pelo Conselho Federal da OAB. “Trabalho para que avancemos na PEC 17 e para que tenhamos uma discussão no STF acerca do descumprimento da Lei por parte da Presidência da República. Conversei com o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, e ele ficou sensibilizado porque tem dimensão da importância para a cidadania a privacidade e a proteção dos dados pessoais. Será uma grata surpresa se daqui a pouco aparecer uma iniciativa da OAB na defesa da vigência da Lei.”
Para o deputado, há uma leitura equivocada do governo, especialmente do ministro Paulo Guedes, que desconsidera as implicações econômicas de o Brasil contar com uma legislação de proteção de dados. “Um dos principais adversários da ANPD é o ministro da Economia. Na visão dele, se quer criar mais uma burocracia, mais uma estrutura, mais um órgão, coisa de estatismo da esquerda. Falou isso numa reunião fechada. É claro que o ministro analógico, que não entende sequer o que é a economia digital e a relevância para a economia do Brasil, em que podíamos ser relevantes neste momento exportando serviços nessa área.”
Luís Osvaldo Grossmann, Convergência Digital, 14 de agosto de 2020