Direção da Anatel e Procuradoria brigam por regra própria para pregões

jul 16, 2010 by

Sob o manto da defesa de sua autonomia, a Agência Nacional de Telecomunicações se recusa a seguir as regras que valem para toda a administração pública na compra de materiais e serviços. O órgão regulador, que já se vale de um regulamento próprio para licitações, tenta estabelecer outro, específico para pregões eletrônicos.

Com essa estratégia, a Anatel procura escapar do alcance da legislação federal sobre pregões (Lei 10.520/2002) e pregões eletrônicos (Decreto 5.450/2005) e, de certa forma, acaba fugindo da própria Lei de Licitações (8.666/93), uma vez que adota normas elaboradas internamente para regular suas próprias compras públicas.

O projeto, porém, enfrenta resistência da procuradoria jurídica, que insiste em recomendar “a inteira submissão às regras de licitações e contratos administrativos”. Por isso, tem reiterado a prática de “não aprovar edital e minuta de contrato em razão da inobservância dos ditames da referida legislação”, conforme relato da Superintendência de Administração Geral ao Conselho Diretor da Anatel.

Explica-se: Para o Conselho Diretor, a Anatel não está obrigada a cumprir a legislação referente aos pregões. Baseia-se, para isso, no artigo 54 da Lei Geral de Telecomunicações, de 1997, pelo qual “a agência poderá utilizar procedimentos próprios de contratação, nas modalidades de consulta e pregão”. Vale lembrar que ambos eram novidade na administração, podendo-se considerar a agência pioneira no uso desses instrumentos.

Cinco anos depois, porém, foi estabelecida uma legislação federal sobre o uso dos pregões em compras públicas, a Lei 10.520/2002. Em 2005, o Decreto 5.450 regulamentou o pregão eletrônico, subordinando a ele “além dos órgãos da administração pública federal direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União”.

A Anatel, no entanto, prefere manter a interpretação de que a LGT lhe dá poderes acima da legislação posterior e escora-se em um parecer e numa nota técnica da própria procuradoria especializada da agência. Os dois documentos sustentam o entendimento de que “as disposições da Lei 10.520/2002 e o Decreto 5.450/2005 não são aplicáveis no âmbito da Agência Nacional de Telecomunicações”.

Tanto o parecer quanto a nota técnica foram elaborados quando o Procurador-Geral da Anatal era Antônio Domingos Bedran, hoje membro do Conselho Diretor. Com a saída dele daquele cargo, mudou também a interpretação sobre o assunto. Ao ponto de, no ano passado, com base em uma novo parecer, a procuradoria ter revogado os dois documentos. Mais do que isso, deu força normativa à análise nova, pela qual a agência não pode se esquivar de seguir a legislação federal sobre pregões, inclusive os eletrônicos.

Não surpreende, portanto, que o Superintendente de Administração Geral, Rodrigo Barbosa, em memorando ao Conselho Diretor, afirme que a postura da procuradoria “tem inevitavelmente gerado impasses para o prosseguimento das licitações”.

o memorando gerou também um bate-boca acalorado entre Barbosa e a gerente-geral da consultoria jurídica da agência, Fernanda Bussacos – episódio que rendeu uma representação contra o superintendente encaminhada à Advocacia-Geral, à Controladoria-Geral da União e ao Ministério do Planejamento. (veja matéria neste portal)

Barbosa vem encontrando respaldo no Conselho Diretor. Como a procuradoria revogou os atos que sustentavam a interpretação ampla da autonomia da agência, o colegiado não se deu por vencido. Na reunião de 18 de março deste ano, pelo já tradicional placar de 4 a 1, reafirmou o entendimento de que a legislação sobre pregões não se aplica à Anatel e determinou que a superintendência de administração dê prosseguimento à elaboração de uma regra própria.

Tampouco causa surpresa que essa decisão do Conselho Diretor se deu com a maioria dos conselheiros – com exceção de Emília Ribeiro – seguindo o voto de Antônio Bedran. Afinal, ninguém melhor para defender a interpretação dos atos revogados pela procuradoria especializada da Anatel do que o responsável último pela elaboração do parecer e da nota técnica.

Enquanto o superintendente de administração vocifera contra os procuradores e o Conselho Diretor tenta dar o ‘drible da vaca’ na área jurídica da agência, a procuradoria aguarda uma posição formal da Advocacia-Geral da União sobre o assunto. É que, em geral, pareceres jurídicos são opinativos, mas o Supremo Tribunal Federal incluiu o tema licitações nos casos em que a manifestação das procuradorias “não se limita a simples opinião”.

Não é por menos que a procuradoria, em maio, sustentou que “a decisão do Conselho Diretor não deve ser considerada pelos gestores responsáveis no encaminhamento das aquisições e contratações da agência”. No mesmo parecer, entende que a Superintendência de Administração está num “beco sem saída” entre desobedecer o Conselho ou o jurídico. Mas alerta: “a adoção de prática divergente do entendimento da procuradoria levanta a possibilidade de futura responsabilização dos gestores.”

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