Marco Civil: pontos polêmicos vão além da neutralidade

out 15, 2012 by

Aparentemente, o grande embate em relação ao substitutivo relator do Marco Civil da Internet, deputado Alessandro Molon (PT-RJ), se dá sobre qual organismo deve definir as questões técnicas relativas ao gerenciamento aceitável da internet: o Comitê Gestor da Internet, como órgão assessor do Executivo, como propõe o relator, ou a Anatel, como defendem Ministério das Comunicações e a indústria do setor.


A tendência dentro do governo é acompanhar o Ministério das Comunicações, sob o argumento de que é preciso que a tarefa seja atribuída a um órgão de Estado e não a uma entidade da sociedade civil. Quem defende essa posição cita o exemplo do que ocorre nos Estados Unidos e na Europa, onde são os reguladores os responsáveis por definir as situações em que o gerenciamento técnico de rede é aceitável e como deve ser feito. A prática do gerenciamento é admitida desde que atenda a dois princípios: ser transparente ao usuário e não ser discriminatória. Não pode afetar o princípio da neutralidade.

Também Peru e Colômbia, os dois países da América do Sul que têm legislação sobre a internet onde estão estabelecidos princípios como garantia da privacidade, neutralidade da rede e segurança dos dados, delegaram aos seus reguladores a tarefa de cuidar das questões relativas ao gerenciamento técnico.

Mas esse não é o único ponto que preocupa os executivos das operadoras envolvidos no debate. Eles alegam que o texto é restritivo ao desenvolvimento do gerenciamento de rede, que pode ser necessário diante do desenvolvimento da internet. “Não podemos criar uma legislação que engessa”, afirmam, lembrando que tanto na Europa como nos Estados Unidos a necessidade de gerenciamento de rede é um tema pacificado entre reguladores e indústria. O que não está pacificado, e é motivo de denúncias e pedidos de investigação, é o limite do gerenciamento técnico aceitável.

Privilégios para o conteúdo

Outro ponto que chama a atenção de especialistas ligados à indústria de telecom é o fato de o substitutivo do relator Molon prever um tratamento discriminado entre os provedores de conexão e os provedores de conteúdo, em relação ao registro de dados dos usuários. O artigo 12 proíbe a guarda desses dados pelos provedores de conexão. Já o artigo 13 estabelece que os operadores de aplicações (ou conteúdo) podem guardar as informações dos usuários finais.

Por que essa distinção?, perguntam. Eles alegam que basta uma leitura do noticiário mundial sobre as denúncias de invasão de privacidade para saber que elas não só são frequentes, como estão relacionadas a provedores de conteúdo. Já as operadoras de conexão enfrentaram, ao longo dos anos, poucos processos por desrespeito à neutralidade da rede. “A não ser o famoso caso da Comcast, nos Estados Unidos, os demais exemplos são pontuais e localizados”, diz um dos executivos. Assim, afirma ele, causa muita estranheza a distinção de tratamento. “O que é preciso é proteger a privacidade como um princípio fundamental dos valores da internet”, diz ele. Ou seja, não há por que proibir a guarda dos dados só para os provedores de conexão.

Há, ainda, outro ponto que na opinião desses especialistas merece ser debatido com bastante profundidade. Trata-se do artigo 15 do substituto, que prevê que os provedores de conteúdo só poderão ser responsabilizados civilmente (e não mais criminalmente, possibilidade presente no texto anterior), em decorrência de conteúdos de terceiros, se não tiverem adotados as providências requeridas após ordem judicial.

O artigo do substitutivo, além de descartar a responsabilidade criminal, também diz que as providências determinadas pela Justiça serão cumpridas “dentro dos limites técnicos” do provedor. O objetivo desse artigo é preservar a liberdade de expressão do usuário e impedir o estabelecimento da censura sem apoio de decisão judicial. Com esse princípio todos concordam, mas os especialistas da indústria de telecom veem nessas sutis alterações um forte lobby dos provedores de conteúdo na defesa dos interesses de seu negócio. “Destaco isso para mostrar que eles têm interesses próprios, que podem até ser legítimos, mas que são interesses econômicos”, diz a fonte.

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