As Big Techs e a reprodução do machismo e da misoginia
Desde o primeiro Nossa Opinião, há mais de 10 anos, o Instituto Telecom tem defendido a importância da inclusão digital. Em 2021, de acordo com União Internacional de Telecomunicações (UIT) havia 2,9 bilhões de pessoas excluídas digitalmente no mundo, sendo que mais da metade da população global feminina não têm acesso à internet.
Mas a luta das mulheres vai além disso. É uma luta, também, contra o machismo reproduzido e alimentado pelos algoritmos criados pelas grandes plataformas digitais, as chamadas Big Techs.
Facebook, Google, You Tube, Amazon, Microsoft, Apple, Twitter) são “administradores de big data, isto é, das grandes massas de dados ou macrodados que manipulam complexos algoritmos de inteligência artificial ao abrigo da rede eletrônica” salienta o professor Muniz Sodré em seu livro A Sociedade Incivil. O que se conhece como ‘sociabilidade de plataforma’, denuncia Sodré, é, na realidade, “uma construção técnica, manipulável por algoritmos, geradora de simulacros (parece, mas não é) participativo”. As Big Techs manipulam informações e decidem o que pode e o que não pode circular na internet. Está correto isso? Claro que não.
Joana Varon, diretora-executiva da organização Codin Rights, afirma: “embora rode a partir de um processo matemático, o algoritmo traz embutido juízo de valor, inclusive sobre o que é considerado ‘feminino’ e ‘masculino”. Por isso, é fundamental exigirmos transparência sobre como são criados esses algoritmos. Não podemos aceitar que sejam desenvolvidos softwares com a marca do preconceito. Os dados têm que ser processados de forma lícita, adequada e segura.
Defendemos a democratização da comunicação, que passa pela regulação de quem controla as redes e produz algoritmos. Algoritmos que reproduzem uma visão conservadora de questões de gênero, família e sexualidade. Não podemos nos submeter passivamente a essa manipulação das Big Techs que continuam a caracterizar as mulheres a partir de concepções machistas, misóginas.
É tarefa de cada uma e de cada um conhecer mais profundamente a Lei Geral de Processamento de Dados (LGPD), em vigor desde setembro de 2020, e cobrar a sua implementação. A Lei, que tem como objetivo proteger os direitos fundamentais de liberdade e privacidade nas redes, reconhece a nossa autodeterminação informativa. Somos os titulares e temos o controle dos nossos dados. A nossa dignidade como humanos está em jogo.
Diz o Art. 1º: “esta Lei dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural”. Cada mulher pode cobrar quais dados cada uma das Big Techs tem sobre ela.
O descumprimento da Lei pode implicar em multas de até R$ 50 milhões de reais.
No campo mais coletivo estamos junto com o Intervozes, organização que trabalha pela efetivação do direito humano à comunicação no Brasil. O Intervozes defende que se elabore uma proposta de regulação democrática “adequada e inteligente, capaz de assegurar ambientes normativos adequados para proteger os direitos humanos das ações dos gigantes tecnológicos, respeitando os padrões internacionais de direitos humanos”.
Nesse Dia Internacional da Mulher, nos juntamos a todas na luta por uma sociedade mais democrática, inclusiva, transparente. O tratamento responsável dos dados e a regulação democrática das Big Techs vão ao encontro do respeito aos direitos das mulheres.
Instituto Telecom, Terça-feira, 8 de março de 2022