Procurada pela Fazenda, Anatel tenta abortar aumento do Fistel
O setor de telecomunicações está em polvorosa com a possibilidade de ser vitimado pelo ajuste fiscal do governo, um corte de gastos estimado em R$ 80 bilhões que mira um superávit primário próximo de 1,2% do PIB. Ainda incerto sobre o destino que terá na redução da desoneração da folha de pagamento, o clima azedou com uma visita que o Ministério da Fazenda fez à Anatel para discutir um aumento no Fundo de Fiscalização das Telecomunicações, Fistel.
Em busca de recursos para o ajuste, a área econômica sugeriu corrigir a taxa, cobrada sobre cada equipamento de telecomunicações instalado, inclusive sobre cada aparelho celular. A proposta de início seria corrigir os valores do Fistel pelo IPCA. O problema é que ele só foi reajustado uma vez, em 1998, e de lá até aqui a inflação medida pelo índice do IBGE acumula alta de 189,3%.
O impacto mais conhecido do Fistel é nos celulares. A cada novo aparelho ativado as empresas devem recolher R$ 26,83, além de R$ 8,80 por ano em que permanecem ativos (esse valor era maior, mas foi reduzido em 2012). Com o uso do IPCA cheio em todo o período, esses valores passariam a R$ 77,6 e R$ 25,4.
Não por menos, a Anatel tentou demonstrar à Fazenda que o impacto seria fatal em um mercado em franco crescimento. Com desonerações de PIS e Cofins, os smartphones estão rapidamente substituindo os celulares comuns nas mãos da maioria dos brasileiros – ao ponto de já representarem 95% dos equipamentos vendidos. Turbinar o Fistel mais do que mataria esse incentivo.
Menos visível aos consumidores, o aumento do Fistel também bateria de frente com os investimentos em redes de telecom. Nas contas do governo, isenções de PIS, Cofins e IPI tiveram sucesso em antecipar investimentos superiores a R$ 16 bilhões, especialmente em redes de fibras ópticas – justamente o alvo do programa de inclusão digital prometido para os próximos meses.
Uma alta no Fistel teria o potencial de anular esses benefícios. E nem seria preciso chegar perto de uma correção total pelo IPCA. As contas apresentadas à Fazenda sugerem que um aumento de 20% sobre o Fistel já representaria um impacto superior a R$ 1 bilhão – número que pode encher os olhos de quem desenha o ajuste fiscal, mas que pode paralisar programas como o REPNBL.
Desde que o Estado de S. Paulo, na segunda-feira, 18, antecipou a proposta de aumento do Fistel, as empresas se juntaram à Anatel no coro de rejeição à ideia. “Um aumento de qualquer percentual, por menor que seja, em uma taxa que sequer está sendo utilizada, vai gerar um efeito bastante indesejável de aumento de preços e freio na expansão do acesso aos serviços, especialmente os de telefonia celular e internet móvel”, disparou a Febratel.
“Propostas para elevação de contribuições aos fundos setoriais, como parte do ajuste fiscal (…) onerarão ainda mais os serviços essenciais de telecomunicações, já sujeitos a uma carga tributária sem paralelos em escala mundial”, sustentou a Telcomp. Nas contas do setor, o Fistel já arrecadou R$ 64 bilhões, mas menos de 10% teriam sido efetivamente utilizados. O setor também se queixa de ser um dos principais arrecadadores de tributos – em média, 30% das contas são impostos, ou algo como 43% da receita líquida das operadoras.
De sua parte, o ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, jura que não teve nenhuma conversa sobre o tema no governo. Até aqui, a Fazenda sondou a Anatel e pediu análises de impacto da medida. Até por isso no Minicom há uma certa confiança de que a ideia não será adotada, pelo menos na primeira leva de ajustes esperada para esta semana. Ou seja, a pasta confia que haverá um mínimo de cordialidade interna no governo e a proposta não será adotada sem que a conversa suba ao nível dos gabinetes.
Luís Osvaldo Grossmann, Convergência Digital, Quinta-feira, 21 de Maio de 2015